"Sou velho de mais
para censurar, mas suficientemente jovem para agir."
Goethe
Quando me disseram que o
senhor presidente da junta de freguesia de Santa Maria dos Olivais,
António Rodrigues, me havia escrito através dos jornais, fiquei
feliz.
Logo imaginei que viesse,
finalmente, abordar os tantos problemas que afetam a nossa grande
freguesia. Sei lá, o estado deplorável e terceiro mundista do
mercado municipal, anunciar que ia finalmente promover a reabilitação
da rua principal de Palhavã, falar dos problemas das empresas da
freguesia, anunciar algum evento cultural dinamizado pela junta. De
alguma forma, dar voz a estas e outras preocupações e anseios dos
seus fregueses.
Sim, se isso alguma vez
aconteceu não se deu por isso, mas intentei que me tivesse
escolhido, agora que está no fim da sua longa como discreta passagem
pela política, para uma espécie de correspondente virtual com quem
falasse para dar a público o que lhe vai na alma.
Depois, li o texto, fiquei
triste. A exemplo de outros protagonistas do PSD local, o meu caro
presidente não está habituado a ser colocado em causa ou a conviver
com a crítica democrática. E afinal, no seu texto ofendido não
escreveu sequer uma resposta, pareceu mais uma justificação, uma
desculpa.
Quando li aquela enigmática expressão que usou referindo-se às dívidas causadas pela
construção do parque de estacionamento atrás do edifício da
câmara municipal,“embora não concordando com elas”, logo me
suscitou o óbvio: por fim um autarca nabantino em ato de contrição!
A reconhecer que grande parte daquilo que andou a votar cegamente ao
longo de mais de uma década, tudo o que ajudou a aprovar sem ler, é
afinal uma inutilidade para os nabantinos e contributo largo para os
milhões da dívida do município.
Mas não, sei que assim não
é, atesto a sua coerência. Das parcas vezes que nestes anos o
ouvimos, foi para defender o seu PSD e o presidente de câmara,
qualquer que fosse. A amizade e lealdade partidária pode ser assim:
contra todas as evidências, cega e clubística. E fê-lo uma vez
mais, no escrito que me dirigiu.
Não pense que estou
chateado consigo por me ter apelidado de mentiroso ou demagógico.
Separo sempre das relações pessoais, os excessos que alguns usam no
debate político. Como comentava comigo alguém da sua família
partidária: “não lhe ligues, é a política”.
E não posso mesmo ficar
chateado consigo. Então se os fregueses de SMO lhe perdoam que, na
prática, não tenham junta, bastando-lhes ter um presidente
simpático, havia eu agora de ficar chateado por meia dúzia de
palavras vãs?
Agradeço, comovido, a sua
preocupação com a minha “carreira política”. Compreendo que,
vindo de um dos autarcas nabantinos com mais responsabilidade e
longevidade, essa preocupação possa revestir-se de maior
importância. Quantos nabantinos se podem lisonjear de há tanto
tempo desempenharem tão bem remunerada função para tão pouca
ação?
Agradeço, mas não gosto de
política a pensar em nenhum cargo ou nenhuma carreira, já ando por
aqui há tempo suficiente para que isso se saiba. Independentemente
da política, sou professor e, apesar da interferência direta do seu
partido no meu caso pessoal, sou dos que, ainda que cada vez menos,
temos o privilégio de continuar a sê-lo,
Agradeço, ainda, a sua
chamada de atenção para a minha juventude. Desde bem cedo na minha
adolescência, há uns vinte anos, estou habituado a que quando
alguém mais velho fica sem argumentos venha com a carta da
juventude. E como me regozijo por isso!
De qualquer forma senhor
presidente, eu percebo a sua necessidade de entrar pelos jogos
florais: - ah, e tal, eu não disse o que o senhor diz que eu disse,
o que eu disse foi que alguém disse...
Pois... Conceda-me esta
simpatia. Na próxima vez que quiser dizer que não disse o que
disse, diga-o na hora, diga-o no local. É que perante a inflamada
intervenção que o senhor teve na Assembleia Municipal, que todos
ouviram, e à qual de imediato eu intervi, o senhor respondeu: nada.
Disse Madame de Stael que
“as ideias novas desagradam às pessoas de idade; elas gostam de se
convencer de que, depois de haverem deixado de ser novas, o mundo, em
vez de se enriquecer, só se perdeu."
Eu não quero acreditar
nisso. Acredito sim que, independentemente da idade, formação,
ideologia política, credo, todos temos alguma coisa a aprender com
todos. E que da discussão séria e frontal nascem melhores soluções
para o coletivo.
Saibamos fazê-lo de forma
destemida. E com apego à verdade.
2 comentários:
Olá boa noite. Venho pedir um simples esclarecimento sobre o parágrafo da Epistola a António (texto no Templário de 31 de Outubro). O parágrafo é o seguinte:
Agradeço, mas não gosto de política a pensar em nenhum cargo ou nenhuma carreira, já ando por aqui há tempo suficiente para que isso se saiba. Independentemente da política, sou professor e, apesar da interferência direta do seu partido no meu caso pessoal, sou dos que, ainda que cada vez menos, temos o privilégio de continuar a sê-lo...
(é a parte da interferência directa do seu partido no meu caso pessoal...)
Um abraço do Ernesto Jana
Caro prof. Jana,
Há coisas tão medíocres que nem valem o esforço das escrever. Um dia destes quando nos encontrar-mos por aí "conto-lhe como foi".
Digamos apenas que, não foi acaso eu ter saído de um lugar de direção numa escola no concelho de Ourém, e regressado a Lisboa.
Abraço.
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