sábado, setembro 22, 2012

com troika ou sem ela?

Tomando como base o que era para ser uma pequena resposta a um comentário do Virgílio Lopes, jovem comunista tomarense, ao post em que divulgo a manifestação em Tomar "que se lixe a troika" e que, resumindo, me falava na necessidade de simplesmente romper com a troika, acabei por me estender no texto e não o publiquei. Recupero-o agora aqui para o mural.

A questão não pode ser colocada dessa forma Virgílio, por mais que a malta dos partidos do eterno protesto não o entendam ou não queiram aceitar. Nós precisamos do dinheiro da troika, e isso é um facto.

A questão essencial não está no memorando, está sim naquilo que está a ser feito usando essa desculpa, mas que na verdade não está lá escrito ou está apenas em linhas gerais.
Um pequeno exemplo: está escrito no memorando como uma das medidas a diminuição do apoio do estado aos privados na área da educação - no entanto, uma das primeiras medidas do governo foi aumentar o subsídio às escolas privadas, apesar de todos os cortes no ensino público.

O problema do país e do governo português (que já se finou), é que estão a ser aplicadas receitas ideológicas que não foram sufragadas e não encontram eco sequer, na maioria daqueles que representam a base social dos partidos do governo - e isso não é democrático, e por isso o governo não tem legitimidade democrática para governar desta forma. (Os desenvolvimentos dos últimos dias são claros quanto a esta questão).
Outro problema não está tanto na austeridade que de uma forma ou de outra teria de acontecer porque, independentemente das razões que nos trouxeram a este ponto, andámos todos, e quando digo todos, refiro-me mesmo aos cidadãos em geral, classe média em particular (e é fácil comprovar isso de muitas forma) a viver acima das nossas possibilidades.
Por isso, o problema, dizia, não está tanto na austeridade, mas sim nas medidas inconsequentes ou lesivas para a maioria dos cidadãos e da sociedade em geral, que não permitem vislumbrar nenhum horizonte de esperança no fim dessa austeridade.

Outra questão essencial é que, ao contrário da lavagem cerebral que Governo e alguma comunicação social tenta efetuar,  há opções, há alternativas. Na política há sempre opções, na Democracia há sempre alternativas. Esta visão enviesada ultra-liberal e minoritária do Governo não é a única opção e não é, lá está, uma alternativa com futuro.
Mas a opção também minoritária dos eternos do protesto em transformar o país num gueto político e social também não é uma alternativa com futuro, e os portugueses, felizmente, nunca a aceitarão.

A política e os partidos já tiveram melhores dias no que diz respeito à sua imagem pública e aceitação pelos cidadãos, com muitas culpas dos próprios partidos e políticos - mas que não se engane o PCP se julga que lucra politicamente com o mal estar do país, que não se engane o PCP (e também o BE) se julga que escapa à imagem global, que não se engane se julga que ser contra tudo e o seu contrário lhes permitirá alguma vez criar nos cidadãos a ideia de que possam ser uma solução para a governação.

E esse é também um dos problemas do país, só há um partido que conta na esquerda portuguesa, porque é o único que conta para governar. Eu sou dos que prefiro governos de coligação a governos de um só partido, mas na esquerda portuguesa não é possível contar com PCP e BE para a governação. Mais, todos sabem que para o PCP e o BE, o maior adversário é o PS, e isso é outro dos problemas.
Portugal é um país sociologicamente mais à esquerda, mas nunca essa esquerda está verdadeiramente representada porque dois partidos não estão disponíveis para discutir, não estão disponíveis para sair do seu mundo e cruzarem-se com o mundo dos outros e o mundo real; não estão disponíveis porque também não sabem mais e não querem expor-se às dificuldades da governação.
A esquerda portuguesa é assim infelizmente coxa, porque apesar de socialmente maioritária, é quase sempre minoritária para governar.

5 comentários:

Virgílio Lopes disse...

Só agora vi o seu artigo.
Apesar de errada, não vou perder tempo com a etiqueta que me pretende colar. Isso são minudências, se comparadas com a tragédia que se está a abater sobre os Porugueses.
Mas estou sem tempo para lhe responder como merece.

Mas não perderá pela demora.
E a resposta não deixará de cosiderar "juros e correcção mometária"...

Até breve.

Virgílio Lopes disse...

Bem me parecia que o seu apoio à manif. de 15/9 estava eivado de HIPOCRISIA.
Só aderiu à parte de baixo do cartaz-convocatório.
"QUE SE LIXE A TROIKA" não é a sua posição política.
Por isso não devia,HIPÓCRITAMENTE, ter promovido e participado numa manifestação e num espírito que não era, nem é o seu.

MAS ADIANTE.


Você proclama :

"Nós precisamos do dinheiro da troika, e isso é um facto."

Eu respondo :

Até pode precisar, pelo menos de uma parte.
Mas não é a qualquer preço, aceitando transformarmo-nos em 10 milhões de ratinhos de um laboratório ultra neo-liberal.
Aceitando hipotecar e vender o País a pataco, aceitando o empobrecimento e a miséria como "imagem de marca".

Você proclama :

"A questão essencial não está no memorando, está sim naquilo que está a ser feito usando essa desculpa, mas que na verdade não está lá escrito ou está apenas em linhas gerais."

Eu respondo :

Você não leu o memorando,nas linhas e sobretudo nas entrelinhas.
Ou ignora que as "linhas gerais" foram e são uma porta escancarada para futuras e programadas exigências de cariz marcadamente ideológico ?
Que são uma espécie da rúbrica "Diversos" dos Orçamentos Públicos, que apenas visam esconder receitas e despesas espúrias ?
O facto deste governo de garotos negociantes e incompetentes ser mais troikista que a troika não ilude a essência do memorando que foi negociado e assinado pelo seu partido.

Você proclama :

"...andámos todos, e quando digo todos, refiro-me mesmo aos cidadãos em geral, classe média em particular (e é fácil comprovar isso de muitas forma) a viver acima das nossas possibilidades."

Eu afirmo :

É FALSO!
Somos 10 MILHÕES.
Qual a percentagem?
Confundir a maioria dos Portugueses com minorias privilegiadas, algumas ao ponto do OBSCENO, é inaceitável para alguém que se diz socialista.

Próximamente, voltarei a tratar este tema/patranha no meu blogue.

Você proclama :

"Por isso, o problema, dizia, não está tanto na austeridade, mas sim nas medidas inconsequentes ou lesivas para a maioria dos cidadãos e da sociedade em geral, que não permitem vislumbrar nenhum horizonte de esperança no fim dessa austeridade."

Eu respondo:

A austeridade não é inócua, nem "branca". Tem cor, tem um sinal ideológico, é um instrumento contra alguém, ao serviço de alguém.
A austeridade voltada contra os que pouco ou nada contribuiram para a crise, poupando a minoria que a causou através da economia de "CASINO", é injusta, errada e ineficaz.
Só provoca miséria e revolta.
No fundo, até do ponto de vista dos seus beneficiários, vai gerar contradições e convulsões sociais que porão o seu poder e domínio em causa.

(CONTINUA...)

Virgílio Lopes disse...


(CONTINUAÇÃO...)




Você proclama ;

"...ao contrário da lavagem cerebral que Governo e alguma comunicação social tenta efetuar, há opções, há alternativas."

É VERDADE!
Mas também é verdade que se a alternativa não pode ser construída (política e sociológicamente) sem o PS, também não existirá só com o PS.
E o PS, sózinho ou coligado com a direita, é CO-RESPONSÁVEL da situação em que o País se encontra.
As manifs. também são contra OS DIRIGENTES E GOVERNANTES DO PS.
Se o PS quiser evitar a "pasokização" tem de mudar de rumo, tem de passar a ser um partido da esquerda, ao contrário do que hoje é :
PARTIDO DO CENTRÃO DE INTERESSES!
Tem que deixar de ser o PSD cor de rosa.
E, está claro, que do lado do PCP e do BE também tem que haver alterações estratégicas e tácticas.

O POVO (maioritáriamente de esquerda) NÃO PERDOARÁ ao PS, PCP e BE o crime histórico de continuarem a não se entenderem para apresentarem um PROGRAMA COMUM DE GOVERNO que,necessáriamente, não poderá ser o programa político de qualquer deles.
Mas tem de ser muito diferente do que o PS tem feito.

PORQUE TEM DE SER :

DECENTE.
ÉTICO E MORALIZADOR DA VIDA NACIONAL.
APENAS FIEL AOS INTERESSES COLECTIVOS DOS PORTUGUESES.

Sem RELVAS e sem COELHONES.
Sem boys e girls.
Sem frotas de luxo.
Sem mordomias obscenas.
Sem um Estado paralelo para alojar as clientelas com cartão.

E tome nota, Hugo Cristóvão :

Se o PS,
Se o PCP,
Se o BE,

não mudarem, não se entenderem, não mudarem radicalmente a forma de fazer política, a tragédia vai acontecer:

O APOIO DO POVO a um qualquer ditador, mais ou menos populista, que se apresente com um PROGRAMA PARA A DECÊNCIA, mesmo que dias depois o rasgue.

E é o que pode acontecer em todo o
Sul da Europa.

E não se pense que a UE ou a NATO não o vão permitir.

As ditaduras que duraram dezenas de anos em Portugal, na Espanha e na Grécia sempre contaram com a condescendência da CEE.

CUIDADO!!!

HC disse...

Vírgílio,
não vou responder-lhe ponto por ponto, não só porque não tenho tempo, mas porque aquilo que escrevi no post me parece suficientemente explicativo.
Apenas alguns pontos:

Se a manifestação tivesse apenas como fim o literalmente expresso no título (e isso nunca acontece nestas manifestações de massas, com as quais, já o disse várias vezes, normalmente não me sinto identificado porque costumam ser demasiado ambivalentes)você teria assistido a uns parcos milhares de pessoas na rua e não à maior manifestação que já existiu no nosso país.

O memorando é o que lá está escrito e não a interpretação que cada um faz dele. É uma linha condutora que permite a qualquer governo muitas variáveis.

Andámos, todos, a viver acima das nossas possibilidades nos últimos largos anos. E há muito dados que o demonstram, particularmente quando comparados com outros países, por exemplo:
Recurso ao crédito para compra de casa VS aluguer de casa; recurso ao crédito pessoal, número de créditos acumulados por um só cidadão; uso de créditos para viagens, eletrodomésticos de topo, automóveis; nº de telemóveis em uso; nº de cartões de crédito em uso; nº de centros comerciais; .....
A realidade é como é, é difícil encontrar alguém que seja santo.

Comparar o Jorge Coelho com o Miguel Relvas, ó Virgílio, francamente! Por aquilo que já li, tenho-o como alguém que é capaz de usar o intelecto e não apenas fazer aquelas generalizações que tantos portugueses fazem, e que também explicam muito do estado da nossa sociedade.

Uma união da esquerda em Portugal? Absolutamente de acordo, já o disse muitas vezes. E mais, já tentei contribuir para isso ao nível local.
Terá que indagar, se ainda não percebeu as evidências, junto do PCP e do BE, porque fazem do PS sempre o inimigo principal, e porque tornam assim impossível que o PS, por mais que queira, se possa com eles coligar.


até

Virgílio Lopes disse...


Hugo Cristóvão,

Só lhe digo três coisas que se aplicam ao que disse antes e ao que diz hoje:

1ª - As análises de um qualquer político que defende causas (e não interesses) e luta por elas devem, sempre, ser perseguidas pelo PORQUÊ? A cada conclusão, interrogar sempre - PORQUÊ ?
Só assim será profunda, séria, não superficial.
Se o fizer perceberá bem a natureza, as causas, os agentes, os promotores, os responsáveis efectivos da dívida externa - pública e privada. E dentro da privada - empresas, bancos, famílias, cidadãos singulares.
Perceberá o papel dos principais credores no endividamento induzido e nos posteriores garrotes e usura.
Mergulhe FUNDO.
Não se fique pelo SUPERFICIAL.

2ª - O seu mal (político) e do PS é que teimam em estar, simultâneamente, SENTADOS EM DUAS CADEIRAS.

3ª - Eu não comparei ou pus no mesmo plano Relvas e Jorge Coelho.
O que eu disso e reafirmo é o País tem de se ver livre do que eles representam - promiscuidade inaceitável, éticamente obscena, entre funções públicas e privadas.

De resto, a vida irá mostrar-nos quem tem a maioria da RAZÃO.
Os que pensam como você ou os que pensam como eu.